Publicação Contínua
Qualis Capes Quadriênio 2017-2020 - B1 em medicina I, II e III, saúde coletiva
Versão on-line ISSN: 1806-9804
Versão impressa ISSN: 1519-3829

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Fatores associados ao estresse parental em unidade de terapia intensiva neonatal: estudo transversal

Amanda de Souza Brondani1; Leonardo Bigolin Jantsch2; Luciane Flores Jacobi3

DOI: 10.1590/1806-9304202400000292 e20230292

RESUMO

OBJETIVOS: verificar fatores associados ao estresse parental em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTI Neonatal) de pequenos municípios.
MÉTODOS: estudo quantitativo transversal, com pais de recém-nascidos internados em UTI Neonatal de dois hospitais filantrópicos. Os instrumentos utilizados foram Parental Stress Scale: Neonatal ICU e Percepção do Cuidado Centrado na Família - Pais. A análise foi realizada de acordo com a natureza de distribuição das variáveis.
RESULTADOS: de 129 voluntários, 79,8% apresentaram estresse parental. As médias de estresse nos domínios “sons e imagens”, “aparência e comportamento do bebê” e “alteração no papel da mãe/pai” observadas foram, respectivamente, 1,9, 2,9 e 3,7 na Parental Stress Scale: Neonatal ICU. Houve associação significativa entre gênero dos participantes (p=0,018) e intercorrências clínicas durante a hospitalização (p=0,044) com estresse parental. Observou-se diferença nos grupos na variável “tempo de internação até o momento da coleta de dados” (p=0,011), nos domínios “respeito” (p=0,026), “colaboração” (p=0,006) e na soma total (p= 0,011) da escala Percepção do Cuidado Centrado na Família - Pais.
CONCLUSÃO: estresse parental esteve associado à alteração no papel de mãe/pai; às mães e à ocorrência de intercorrências clínicas com o bebê durante sua hospitalização.

Palavras-chave: UTI neonatal, Recém-nascido, Parentalidade, Estresse psicológico, Relações profissional-família, Assistência integral à saúde

ABSTRACT

OBJECTIVES: verify the factors associated with parental stress in Neonatal Intensive Care Unit (Neonatal ICU) of small municipalities.
METHODS: cross-sectional quantitative study, with parents of newborns admitted in the neonatal ICU in two philanthropic hospitals. The instruments used were the Parental Stress Scale: Neonatal ICU and Perceptions of Family-Centered Care – Parents. The analysis was performed according to the nature of the distribution of the variables.
RESULTS: of the 129 volunteers, 79.8% showed parental stress. The averages of stress in the domains “sights and sounds”, “baby looks and behaviors” and “alteration in the mother/father role” was observed, respectively, 1.9, 2.9 and 3.7 in Parental Stress Scale: Neonatal ICU. There was a significant association between the gender of the participants (p=0.0182) and clinical complications during the period of hospitalization (p= 0.0443) with parental stress. A difference was observed in the groups of the variable “hospitalization time to the moment of the data collection” (p= 0.0112), in the domains “respect” (p=0.0266), “collaboration” (p=0.0060) and in the total sum (p= 0.0112) of the Perceptions of Family-Centered Care – Parents scale.
CONCLUSION: parental stress was associated with changes in the role of the mother/father; with the mothers and the occurrence of clinical complications with the baby during its hospitalization.

Keywords: Neonatal ICU, Newborn, Parenting, Psychological stress, Professional-family relations, Integrative health care

Introdução
Anualmente, a cada 1000 recém-nascidos (RN) vivos no mundo, entre 64 e 80 deles necessitam de cuidados intensivos em unidade de terapia intensiva neonatal (UTI neonatal).1 A internação de um RN na UTI neonatal pode acarretar alterações emocionais e de saúde também em seus pais.2 Alguns fatores estressores presentes na UTI neonatal, na concepção parental, são os ruídos, a alternância de luminosidade e penumbra, a presença de tubos e equipamentos, a aparência frágil dos bebês,3 as funções e a empatia da equipe multiprofissional, a necessidade de comunicação e informação, o medo da morte do RN, os sentimentos de culpa e vergonha, além da separação de seu filho.4-6 Somado a isso, os cuidados com o bebê são realizados pela equipe de saúde, fazendo com que os pais sintam-se expectadores, comprometendo o reconhecimento das funções de mãe e pai, o que, adicionado ao estresse relacionado ao ambiente, podem interferir negativamente na vinculação com o bebê e em seu desenvolvimento.7,8
A participação dos pais na UTI neonatal é muito importante, já que sua permanência está associada à melhora no neurodesenvolvimento do bebê, além de otimizar a relação parental e melhorar a percepção do estresse na UTI neonatal.9 Apesar da existência da Lei nº 13.257, de 2016, a qual dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância, e que regulamenta que as UTIs neonatais devem proporcionar condições para que o pai, a mãe ou outro responsável permaneça em tempo integral durante a internação do bebê, ainda há muitos obstáculos no cumprimento desse direito.10
Os cuidados com os RN devem incluir a família e suas necessidades, conforme o preconizado pelo Cuidado Centrado na Família (CCF).5,11 Algumas medidas que otimizam a assistência são a garantia de acesso livre dos pais na UTI neonatal, respeito aos seus valores e crenças, escuta ativa e fornecimento de informações completas e imparciais sobre seu bebê e encorajamento para participar da tomada de decisões e do cuidado com o bebê.11 Estas e outras ações refletem na diminuição do tempo de internação hospitalar, maior autonomia parental, qualificação da percepção dos pais referente à internação e redução do estresse parental.12 O CCF, nos últimos anos, enfrentou desafios em sua incorporação devido à situação epidemiológica da COVID-19, que traz inúmeras repercussões tanto para a inclusão da família nos contextos de cuidado quanto para o estresse parental vivenciado pelos pais e outros membros da família.13
Apesar de a internação em UTI neonatal ser necessária em diversos casos e garantir a sobrevivência do RN de risco, demonstra ser um ambiente com inúmeros fatores estressores tanto para o bebê quanto para sua família. O objetivo deste estudo foi verificar os fatores associados ao estresse parental na UTI neonatal, considerando o contexto do CCF em dois municípios de pequeno a médio porte.

Métodos
Trata-se de um estudo observacional, com delineamento transversal, de abordagem quantitativa. Os participantes do estudo foram pais e mães de recém-nascidos internados em UTI neonatal, que haviam frequentado a unidade pelo menos três vezes antes da coleta de dados. O intervalo de participação escolhido foi entre cinco e 15 dias de internação do bebê. Considerou-se o limite inferior de dias de internação a fim de que os pais pudessem ter experiências dentro do contexto da UTI neonatal para responder aos instrumentos propostos e o superior para dar homogeneidade aos participantes.
Foram excluídos pais de recém-nascidos internados diretamente em unidade de cuidados intermediários convencional ou canguru; aqueles com menos de 18 anos de idade no momento do convite para participar do estudo ou que não possuíssem condições cognitivas para responder o instrumento de coleta de dados, considerado pela equipe de saúde. A população foi constituída pela totalidade de pais e mães elegíveis de recém-nascidos internados nas UTI neonatal de duas instituições, no período estudado.
A coleta de dados ocorreu no período de maio a outubro de 2021, em dois hospitais do sul do país, ambos de caráter filantrópico, dispondo de 10 leitos de UTI neonatal cada um. As instituições foram escolhidas com base na disponibilidade geográfica dos pesquisadores. O Hospital A atende pacientes de 22 municípios da região noroeste do estado. Possui 155 leitos de internação e três unidades de terapia intensiva (adulto, pediátrica e neonatal). O Hospital B faz parte de um dos maiores complexos hospitalares da região norte do estado. É um centro de referência para a macrorregião norte do estado para o SUS, abrangendo 158 municípios e atendendo a uma população de aproximadamente 1.600.000 habitantes. No Hospital A, pais e mães podiam permanecer na UTI neonatal em tempo integral, exceto durante a troca de turnos da equipe e em alguns procedimentos. Enquanto isso, no Hospital B, a permanência dos pais ocorria em um sistema de visitas, duas vezes por turno, com uma hora de duração cada. As rotinas de visitas em ambos os hospitais não foram alteradas durante a pandemia. Primeiramente, os participantes elegíveis foram captados via telefone, por meio dos contatos cadastrados no sistema de registros das instituições, e convidados a participarem da pesquisa. Em seguida, foram enviados, via aplicativo Whatsapp, aos pais e às mães que aceitassem participar, os instrumentos de coleta, na versão digitalizada. Neste formulário eletrônico, que era respondido online, constava, na primeira seção, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O restante do formulário só poderia ser acessado caso o participante concordasse com o TCLE. Após o preenchimento dos instrumentos, as respostas eram automaticamente enviadas ao e-mail dos pesquisadores. A coleta de dados ocorreu inteiramente de forma virtual, justificada pela intensificação das infecções por COVID-19, e foi realizada por uma equipe de acadêmicos e residentes treinados.
Os questionários utilizados foram Parental Stress Scale: Neonatal Intensive Care Unit (PSS: NICU) e Percepção do Cuidado Centrado na Família – Pais versão brasileira (PCCF-P versão brasileira), ambos validados e traduzidos para a língua portuguesa do Brasil,14,15 além de instrumento de caracterização dos participantes, de dados obstétricos e dos recém-nascidos, produzido pelos autores. A PSS: NICU16 objetiva avaliar a percepção dos pais quanto aos fatores estressores presentes nos ambientes físico e psicossocial da UTI neonatal. O instrumento é do tipo Likert, com pontuação de 1 a 5, sendo que 1 refere-se a “não estressante” e 5 a “extremamente estressante”. Ainda há a opção “não se aplica”. Considerou-se a métrica “1” e o ponto de corte “2” para dividir os grupos em “Com estresse” (pontuação igual ou maior do que 2) e “Sem estresse” (pontuação menor do que 2).5
A PCCF-P é uma escala de percepção do CCF para pais e tem o objetivo de medir e comparar as perspectivas de pais sobre o CCF em diferentes contextos pediátricos.17 Esta escala de medida também é do tipo Likert, contando com quatro alternativas de respostas para cada pergunta: 1 - nunca, 2 - às vezes, 3 - geralmente e 4 – sempre.15 A quantificação das respostas varia entre 20 e 80, sendo que, quanto maior o valor da soma, mais positiva é a percepção dos pais.18
As variáveis qualitativas foram apresentadas pelas frequências absoluta e relativa. Realizaram-se cruzamentos simples das variáveis qualitativas e, para verificar a associação entre elas, foi utilizada a medida odds ratio (OR) e seu intervalo de confiança. A análise foi realizada no software Statistica 9.1, sendo considerado de significância achados com p≤0,05. As variáveis quantitativas foram apresentadas por média (± desvio-padrão), mediana, mínimo e máximo. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de uma Instituição de Ensino Superior Pública, CAAE 43938621.8.0000.5346, em abril de 2021, e pelas instituições onde ocorreram as coletas.

Resultados
Participaram do estudo 129 voluntários, 62,8% eram mães, com média de idade de 29 (±6,1) anos e faixa etária entre 20 e 46 anos. O predomínio foi de pais que possuíam o ensino médio completo (43,4%) como escolaridade máxima e que não residiam no município em que seu recém-nascido esteve internado (62,8%). Em relação ao tempo de permanência parental diária na UTI neonatal, o período estendeu-se de 30 minutos a 16 horas, com média de 3,7 (±3,3) horas. Referente à percepção dos pais sobre este tempo na UTI neonatal, 48,8% dos participantes afirmaram considerá-lo “pouco”.
Considerando-se os dados obstétricos, 53,4% das gestações eram de alto-risco, em 65,1% houve complicações obstétricas e 97,6% das mulheres realizaram pré-natal. Dentre as complicações, destacam-se pré-eclâmpsia, trombofilia, diabetes, descolamento de placenta, centralização fetal e hipotireoidismo.
Referente aos neonatos, o tempo médio de internação em UTI neonatal até o momento da coleta de dados foi de 8 dias, a predominância foi de recém-nascidos masculinos (68,9%), prematuros moderados e tardios (68,9%), com média de 2,1kg, com via de nascimento cesariana (80%). As principais causas de internação em UTI neonatal foram prematuridade e disfunção respiratória (60%), 75,5% passaram por intercorrências clínicas durante o período em que permaneceram na unidade e 95,5% utilizavam algum tipo de dispositivo. Além disso, 78,9% não estavam em uso de suporte ventilatório no momento da coleta de dados, porém 65,5% deles já o haviam utilizado durante a internação.
Dentre os participantes, 79,8% apresentaram estresse. Realizou-se análise descritiva da PSS: NICU. Os resultados estão expostos na Tabela 1. No domínio “Sons e imagens”, as situações mais estressantes, na percepção dos pais, foram “Ver a máquina (respirador) respirar pelo meu bebê” (média 3,0) e “O barulho repentino do alarme dos monitores” (média 2,1). No domínio “Aparência e comportamento do bebê”, os itens que receberam maiores pontuações nesta categoria foram “Quando meu bebê parece estar sentindo dor” (média 3,8) e “Quando meu bebê parece estar triste” (média 3,8). Já no domínio “Alteração de papel de mãe/pai”, os fatores assinalados como mais estressantes foram “Estar separado(a) do meu bebê” (média 4,2) e “Sentir-se desamparada(o) e incapaz de proteger o meu bebê da dor e de procedimentos dolorosos” (média 4,1).
 


Foram realizadas associações entre variáveis de caracterização dos participantes, dados obstétricos e neonatais com o instrumento PSS:NICU. Os resultados encontram-se dispostos na Tabela 2. Observou-se que somente duas variáveis apresentaram associação significativa com estresse parental: gênero dos participantes e intercorrências clínicas dos recém-nascidos durante o período de internação na UTI neonatal. O estresse parental é significativamente (p=0,0182) maior, com chance de quase 3 vezes, nas mães, quando comparado aos pais. Ademais, a presença de intercorrências clínicas com o bebê durante a estada na UTI neonatal possibilita 2,6 vezes mais chance de ocorrência de estresse parental nos participantes (p= 0,0443).
 


As variáveis quantitativas também foram analisadas. Suas médias (±desvio-padrão) e medianas encontram-se dispostas na Tabela 3. Na Figura 1, é apresentada a soma obtida por cada respondente na escala PCCF-P versão brasileira para cada grupo da PSS:NICU. Observa-se que houve diferença entre os grupos nos domínios do PCCF-P “respeito” (p=0,0266) e “colaboração” (p=0,0060), bem como na soma total (p=0,0112) do instrumento, em que foi observada uma concentração de respostas nas maiores pontuações no grupo “sem estresse”. Ademais, “tempo de internação até o momento da coleta de dados” (p=0,0112) também apresentou diferença entre os grupos.
 

 




Discussão
O estresse parental na UTI neonatal foi associado a mudanças no papel da mãe/pai; ao gênero dos participantes e também à ocorrência de intercorrências clínicas com o bebê durante a hospitalização. Observou-se uma diferença nos grupos na variável “tempo de internação até o momento da coleta de dados”, nos domínios “respeito”, “colaboração” e na soma total da escala de Percepção do Cuidado Centrado na Família – Pais.
Conforme mostrado na análise do PSS: NICU, o domínio com a média mais alta foi “Alteração no papel de mãe/pai”, cujos fatores indicados como mais estressantes foram “Estar separado(a) do meu bebê” e “Sentir-se desamparada(o) e incapaz de proteger o meu bebê da dor e de procedimentos dolorosos”, de maneira semelhante a estudos que apontam os mesmos resultados.19,20
A separação entre pais e bebês imposta pelo ambiente da UTI neonatal é considerada como uma das principais fontes de estresse, pois os pais sentem-se sobrecarregados e impotentes, além de que os bebês recebem pouco apoio e interação parental.21 Durante a internação, os pais passam o cuidado de seus filhos aos profissionais de saúde, evidenciando a separação do bebê e a dificuldade de fazer parte do serviço e vivenciar suas funções parentais.4,19,22 Durante a internação do bebê, as oportunidades de envolvimento dos pais no cuidado apresentam-se limitadas. Esse acesso restrito dos pais ao seu papel de cuidadores interfere diretamente em seu bem-estar afetivo e psicológico, além de impactar no estabelecimento de vínculo afetivo.3 O alto nível de estresse pode ser minimizado com o apoio da equipe de saúde, incorporando metodologias do CCF e otimizando a participação dos pais no processo de cuidado.11
A hospitalização infantil está diretamente relacionada à presença parental. Porém, no cenário dos cuidados intensivos, essa situação é desafiadora, pela alta complexidade dos procedimentos realizados e devido ao horário reduzido de visitação ainda existente em algumas unidades,23 assim como em uma das instituições analisadas no presente estudo. Um estudo conduzido na Finlândia em 2015 verificou uma média de permanência de 9,7 horas no local, principalmente durante o dia. Também demonstrou que as unidades em que possibilitavam o pernoite dos pais, o tempo de permanência era maior.24 Uma das unidades pesquisadas neste estudo permite, conforme legislação, que os pais frequentem a UTI neonatal durante as 24 horas do dia, porém a estrutura física não favorece o pernoite, devido ao espaço limitado, pelo conforto insuficiente, entre outros empecilhos.
Outro fator condicionante que dificultou a presença dos pais durante as hospitalizações pediátricas foi o contexto da pandemia de COVID-19. O CCF destaca-se como uma filosofia de cuidado que promove a participação da família nas decisões e no cuidado de seus entes queridos. No entanto, durante a pandemia de COVID-19, houve o risco de retrocesso na implementação dessa abordagem devido às preocupações com a potencial disseminação do vírus, o que poderia afastar a família desse contexto. É crucial refletir sobre cada situação individualmente, pois aplicar uma regra única para todos desrespeitaria a singularidade de cada pessoa e de sua família.25
As famílias devem ser vistas não apenas em termos de restrições à sua entrada e permanência no hospital, como potenciais disseminadoras de infecções, mas como parceiras no desenvolvimento de estratégias e ações durante a crise, bem como no planejamento de passos futuros, incluindo para potenciais pandemias futuras. Esses resultados também destacam a importância do CCF na redução do estresse parental na UTI neonatal.26
O estresse parental é significativamente maior em mães quando comparado a pais. Uma meta-análise corrobora esse achado presente no estudo, destacando que a admissão na UTI neonatal é mais estressante para as mães do que para os pais e pode impactar a saúde mental e a qualidade de vida.27 Mães relataram uma prevalência combinada maior de estresse, ansiedade e depressão do que pais, possivelmente atribuível aos seus sentimentos em relação ao nascimento de um filho doente.28
Isto pode ser explicado devido às diversas transformações experimentadas pelas mulheres durante o período gestacional e puerpério, ao papel de cuidadoras principais que as mães possuem, além de normalmente passarem mais tempo na UTI neonatal do que os pais. Além disso, os pais podem ter acesso facilitado aos bebês logo após o nascimento devido a retornarem ao trabalho mais precocemente e pelas mães apresentarem maiores riscos perinatais. Outro fator importante é a limitação à amamentação, situação mais angustiante para as mães.3
Há 2,6 vezes mais chance de ocorrência de estresse quando há presença de intercorrências clínicas com o bebê durante a estada na UTI neonatal. Esta situação está diretamente relacionada com maior risco de morte, instabilidade clínica, separação dos pais e do bebê, sentimento de impotência e insegurança dos pais, aumento do tempo de internação do RN, entre outros agravos, os quais podem explicar a associação com o estresse dos pais. A instabilidade clínica do bebê está relacionada à menor presença dos pais, colo e contato pele a pele na UTI neonatal. Quando seu filho está em uso de ventilador mecânico ou está clinicamente frágil, os pais podem se sentir menos confiantes em sua capacidade de cuidar. Em contrapartida, há maior participação dos pais no cuidado de bebês com menos intervenções médicas.9
O grupo “sem estresse” apresentou uma média de tempo ligeiramente maior, o que pode indicar que, com o decorrer dos dias, os pais criam vínculo com a equipe de saúde e maior segurança em relação ao cuidado. Além disso, a tendência é que os bebês fiquem clinicamente mais estáveis ao longo do tempo, durante seu tratamento, o que gera maior tranquilidade parental. Isso está relacionado à diminuição das necessidades de cuidados intensivos do bebê, fazendo com que os pais se sintam cada vez mais como os principais cuidadores de seus filhos, assumindo seu papel parental. Isso ocorre à medida que podem participar mais ativamente na amamentação, no banho e no contato físico com o bebê.29
Analisando-se as variáveis quantitativas, observou-se uma concentração de respostas nas maiores pontuações no grupo “sem estresse” nos domínios “respeito”, “colaboração” e na soma total da escala PCCF-P, o que indica que, quanto melhor a percepção dos pais em relação ao cuidado centrado na família, menores os seus níveis de estresse na UTI neonatal. Durante o período de internação do RN na UTI neonatal, os pais necessitam de apoio, suporte, incentivo e orientação da equipe.9,21,25
Estudos trazem que a assistência voltada à pratica do CCF está estritamente relacionada à minimização da ansiedade e do estresse parental e à potencialização da autoconfiança e da sensação de segurança e controle dos pais, otimização na adesão ao método canguru, das taxas de aleitamento materno e do vínculo pais-bebê, redução no tempo de internação do recém-nascido e de posteriores reinternações, além de integração com a equipe de saúde.24 Além disso, o neonato vivencia uma melhor adaptação à vida extrauterina, com melhor ganho de peso e regulação dos sinais vitais.23
Uma revisão da literatura indica que o estresse decorrente dos ambientes de UTI neonatal tem sido correlacionado com Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) e ansiedade. Também destaca que há evidências limitadas sugerindo que o envolvimento dos pais, a comunicação eficaz entre os pais e a equipe de saúde, o suporte social adequado e mecanismos de enfrentamento positivos podem atuar como fatores protetores tanto para TEPT quanto para ansiedade.30
Este estudo apresentou como limitação o fato de que a coleta de dados ocorreu inteiramente de forma virtual, justificada pela intensificação das infecções por COVID-19. Essa situação pode ter excluído participantes elegíveis que não tinham acesso a um smartphone ou ao aplicativo WhatsApp. Outra limitação é a falta de dados formais sobre a contaminação da população estudada durante este período nessas instituições.
Um potencial ponto forte do estudo é a oportunidade de conscientizar os profissionais sobre os fatores associados ao estresse parental na UTI neonatal e capacitá-los no CCF. Promover ações que incentivem os pais a participar dos cuidados de seus bebês e ensiná-los de maneira que se sintam confiantes em assumir seu papel parental é essencial. Além disso, permitir e incentivar sua presença em tempo integral é crucial. Isso promoverá maior vínculo entre pais e equipe, entre pais e bebês, fortalecendo a autonomia e a segurança parental e tendo um impacto positivo na redução do estresse parental e no desenvolvimento infantil em médio e longo prazo.
Para estudos futuros, sugerimos investigar mais de perto a inclusão da figura paterna e a representação cultural da figura materna. Além disso, sugere-se abordar a diferenciação do estresse materno entre mães de bebês prematuros e a termo, assim como verificar diferenças entre os períodos pré e pós-pandemia.

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Contribuição dos autores: Brondani AS, Jantsch LB e Jacobi LF: desenho do estudo, coleta e análise de dados, interpretação dos resultados, escrita do manuscrito.
Todos os autores aprovaram a versão final do artigo e declaram não haver conflito de interesses.

Recebido em 8 de Setembro de 2023
Versão final apresentada em 13 de Maio de 2024
Aprovado em 1 de Julho de 2024

Editor Associado: Karla Bomfim

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