Publicação Contínua
Qualis Capes Quadriênio 2017-2020 - B1 em medicina I, II e III, saúde coletiva
Versão on-line ISSN: 1806-9804
Versão impressa ISSN: 1519-3829

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ARTIGOS ORIGINAIS


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Preferências contraceptivas entre mulheres com doença falciforme durante um acompanhamento de 12 meses: um estudo longitudinal

Evelyne Nascimento Pedrosa 1; Maria Suely Medeiros Corrêa 2; Flavia Anchielle Carvalho da Silva 3; Ana Laura Carneiro Gomes Ferreira 4; Manuela Freire Hazin-Costa 5; Ariani Impieri Souza 6

DOI: 10.1590/1806-9304202400000187 e20230187

RESUMO

OBJETIVOS: analisar a escolha e a taxa de continuação do uso de métodos contraceptivos em mulheres com doença falciforme (DF).
MÉTODOS: foi realizado um estudo prospectivo exploratório em um hospital, no qual foram incluídas 44 mulheres com DF com idade entre 15 e 40 anos. Após aconselhamento contraceptivo, as mulheres selecionaram um dos métodos contraceptivos disponíveis e foram separadas em dois grupos, sendo acompanhadas por um, três, seis e 12 meses. Para analisar a taxa de continuação do uso de métodos contraceptivos, os dois grupos foram: grupo (G1) que utilizou apenas contraceptivos de progestágeno, por qualquer via de administração e grupo (G2) que utilizou outros métodos contraceptivos (contraceptivos hormonais combinados e não hormonais). A taxa de continuação foi analisada pela análise de sobrevida de Kaplan-Meier, considerando um p<0,05.
RESULTADOS: após aconselhamento contraceptivo, a maioria das mulheres optou por algum dos métodos contendo apenas progestágeno: contraceptivos injetáveis (n=18; 40,9%), contraceptivos orais (n=7; 15,9%) ou dispositivos intrauterinos (n=3; 6,8%). A taxa de continuação diminuiu em ambos os grupos durante o período de acompanhamento de 12 meses. No G1, a taxa de continuação foi de 60,7% (IC95%= 40,4-76,0), enquanto no G2 foi de 68,7% (IC95%= 40,5-85,6) sem diferença significativa entre os grupos (p=0,641).
CONCLUSÕES: as taxas gerais de continuação em ambos os grupos foram satisfatórias. Não foi observada diferença significativa na taxa de continuação dos métodos contraceptivos entre os grupos, embora a maioria das mulheres tenha preferido métodos somente com progestágeno.

Palavras-chave: Doença falciforme, Anemia falciforme, Contracepção, Adesão do paciente, Adesão à medicação

ABSTRACT

OBJECTIVES: to analyze the choice and continuation rate of contraceptive methods in women with sickle cell disease (SCD).
METHODS: an exploratory prospective study was conducted at a hospital enrolling 44 women with SCD aged 15-40 years old. After contraceptive counseling, the women selected one of the available contraceptive methods and separated into two groups, and were followed up at one, three, six, and 12 months. To analyze the continuation rate of contraceptive use, the two groups were: group (G1) using progestin-only contraceptives, through any route of administration and group (G2) using other contraceptive methods (combined hormonal and non-hormonal contraceptives). The continuation rate was analyzed using Kaplan-Meier survival analysis, considering a p<0.05.
RESULTS: after contraceptive counseling, most women opted for any progestin-only methods: injectable contraceptives (n=18; 40.9%), oral contraceptives (n=7; 15.9%), or intrauterine devices (n=3; 6.8%). The continuation rate decreased in both groups during the 12-months follow-up period. In the G1, the continuation rate was 60.7% (CI95%=40.4-76.0), while that in the G2 was 68.7% (CI95%= 40.5-85.6) with no significant difference between the groups (p=0.641).
CONCLUSIONS: the overall continuation rates in both groups were satisfactory. No significant difference in the continuation rate of contraceptive methods was observed between the groups, although most women preferred progestin-only methods.

Keywords: Sickle cell disease, Anemia sickle cell, Contraception, Patient compliance, Medication adherence

Introdução
A doença falciforme (DF) é uma doença genética e hereditária comum que afeta o desenvolvimento da hemoglobina.1 No Brasil, com etnia e distribuição populacional heterogêneas, estima-se que aproximadamente 60.000 a 100.000 pessoas tenham DF.2 A hemólise e a inflamação crônica são responsáveis pela dor e pelo envolvimento multissistêmico.1,2 Nas últimas décadas, graças à melhora da triagem e aos avanços no gerenciamento de complicações e controle da doença, mulheres em idade reprodutiva com DF estão começando a enfrentar desafios de controle de fertilidade e gravidez.3,4 Mulheres grávidas com DF têm maior frequência de desfechos maternos e fetais desfavoráveis, incluindo crises álgicas, abortos espontâneos, natimortos, partos prematuros, pré-eclâmpsia e mortalidade perinatal e materna.5,6
A contracepção eficaz é uma tarefa complexa e envolve muitas etapas além de simplesmente fornecer educação e aconselhamento, e ainda pode haver muitas barreiras na prevenção de gravidez indesejada e suas consequências.7 No entanto, o aconselhamento sobre contracepção eficaz é considerado uma estratégia importante para reduzir gestações não planejadas. Uma vez que as mulheres são informadas sobre os riscos e benefícios de diferentes métodos contraceptivos, elas podem planejar quando e quantos filhos gostariam de ter.8-11 Além de promover o acesso universal ao planejamento reprodutivo em mulheres com DF, o acompanhamento clínico adequado, o método correto de uso contraceptivo e as taxas de continuação devem ser monitorados.10-12
Muitos fatores podem influenciar o uso contínuo de métodos contraceptivos, incluindo características socioculturais, formas de administração, motivação da paciente ou do profissional, crenças do profissional, condição clínica, gravidade da doença, percepção da paciente sobre o benefício do uso da medicação e acesso aos serviços de saúde.11,13-15
O uso de contraceptivos com progesterona isolada aumentou na última década entre mulheres com DF devido aos seus benefícios positivos para a saúde, sendo classificados como categoria 1 do CDC (Centros de Controle de Doenças) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) (sem restrições ao seu uso).16,17 No entanto, as mulheres com DF não têm conhecimento sobre a eficácia dos contraceptivos e fazem uso limitado de contraceptivos reversíveis quando comparadas à população em geral.15,18 Como as preferências contraceptivas e as taxas de continuação podem variar devido a muitos fatores, é importante investigar se mulheres com DF podem ser mais propensas a selecionar um método contraceptivo somente com progesterona e, consequentemente, usá-lo por um período mais longo em comparação a outros métodos, este estudo teve como objetivo analisar a escolha e a taxa de uso contínuo de métodos contraceptivos em tais mulheres.

Métodos
Este estudo observacional exploratório foi conduzido em um hospital de referência para assistência à saúde da mulher em Recife, Pernambuco, Brasil, de janeiro de 2018 a agosto de 2020. A amostra do estudo foi composta por 44 mulheres com DF, com idade entre 15 e 40 anos, sexualmente ativa e desejo por contracepção. Foram excluídas mulheres que não estavam usando métodos contraceptivos devido ao desejo de engravidar.
As mulheres participantes do estudo foram recrutadas na sala de espera do ambulatório de ginecologia enquanto aguardavam o atendimento; aquelas que aceitaram participar foram entrevistadas para coleta de dados sociodemográficos, clínicos e reprodutivos. Elas receberam aconselhamento contraceptivo e então selecionaram um dos métodos contraceptivos disponíveis no serviço: contraceptivo oral combinado, injetável combinado, pílula de progesterona isolada, injetável de progesterona, dispositivo intrauterino de cobre, dispositivo intrauterino de levonorgestrel, esterilização feminina e preservativa masculino. Implantes contraceptivos, adesivo hormonal e anel vaginal não foram incluídos como opção para as pacientes por não estarem atualmente disponíveis nos serviços públicos de saúde.
Aconselhamento contraceptivo individualizado foi fornecido por dois especialistas (enfermeiro e ginecologista) treinados em planejamento reprodutivo. O aconselhamento seguiu os critérios de elegibilidade da OMS e do CDC.15,16 O aconselhamento incluiu informações sobre cada método disponível, eficácia, mecanismo de ação, uso, contraindicações e possíveis efeitos colaterais. Após as mulheres selecionarem seu método contraceptivo preferido, as instruções de uso foram reforçadas com a verificação da compreensão da mulher. Todas as mulheres receberam o método selecionado para começar no primeiro dia do próximo período menstrual ou foram instruídas a retornar para a inserção do dispositivo intrauterino (DIU), quando este foi o método selecionado.
As mulheres foram instruídas a retornar ao ambulatório após um, três, seis e 12 meses. Em cada acompanhamento, foram avaliados o uso apropriado, a taxa de continuação, o desejo de mudar de método, as queixas clínicas ou ginecológicas e a ocorrência de gravidez. As mulheres que não retornaram foram contatadas por telefone para reagendarem a visita.
Para analisar a taxa de continuação do uso dos contraceptivos, as mulheres foram divididas em dois grupos: um grupo (G1) utilizou métodos contendo progesterona isolada (pílula de progesterona, progesterona injetável ou dispositivo intrauterino com levonorgestrel) e outro grupo (G2) utilizou todos os outros métodos contraceptivos: os hormonais combinados de estrógeno e progesterona (contraceptivo hormonal oral e injetável mensal), o os não hormonais (DIU de cobre, ligadura de trompa e preservativo masculino). A taxa de continuação foi medida pelo autorrelato das mulheres, e a cada retorno, as mulheres foram questionadas se estavam usando o método conforme prescrito e se não interromperam o uso do contraceptivo escolhido por ≥4 semanas.
A análise dos dados foi realizada usando o software STATA 12.1. Os dados das mulheres são apresentados nas tabelas. A taxa de continuação foi analisada usando a análise de sobrevivência de Kaplan-Meier (teste long-rank), considerando um intervalo de confiança de 95%. A significância foi definida em p<0,05.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da instituição onde o estudo foi realizado, em 25 de outubro de 2017, sob o número de aprovação 2.349.314 e número CAAE: 70666317.8.0000.5201.

Resultados
Das 54 mulheres inicialmente selecionadas, dez foram perdidas no acompanhamento, resultando em uma amostra de 44 mulheres para o acompanhamento de 12 meses. Não foi possível saber por que as dez mulheres não retornaram para o acompanhamento. Elas não responderam às ligações telefônicas (fluxograma - Figura 1).
 


As características do genótipo das 44 mulheres do estudo foram as seguintes: 35 mulheres (79,5%) tinham HbSS (hemoglobina SS); 8 mulheres (18,2%) tinham HbSC (hemoglobina SC) e apenas uma mulher (2,3%) tinha HbSD (hemoglobina SD). A idade variou de 18 a 38 anos, com média de idade de 27 (DP: 5,2) anos. A raça/cor parda foi predominante (n= 33; 75,0%) e a maioria delas era casada ou tinha parceiro (n= 32; 72,7%). Entre as 37 mulheres que já tinham engravidado anteriormente, 11 (25,0%) não tinham filhos vivos. A complicação clínica mais relatada durante as gravidezes anteriores foi a crise álgica (n=18; 40,9%) (Tabela 1).
 


Todas as 44 mulheres (100%) relataram ter tido pelo menos um episódio de crise álgica, embora 10 (22,7%) delas não tenham relatado nenhuma crise álgica nos últimos 2 anos. Seis (13,6%) mulheres relataram um evento tromboembólico anterior, enquanto cefaleia foi referido por 34 mulheres (77,3%).
Entre os métodos contraceptivos utilizados antes do aconselhamento, os preservativos masculinos (n=18; 40,9%) e os contraceptivos orais combinados (n=10; 22,7%) foram predominantes. Após o aconselhamento contraceptivo, a maioria (63,6%) optou por métodos somente com progesterona: injetável de medroxiprogesterona (n=18; 40,9%), pílula de progesterona (n=7; 15,9%) e DIU de levonorgestrel (n=3; 6,8%). As outras escolhas foram os preservativos masculinos (n=9; 20,4%), os contraceptivos orais combinados (n=4; 9,1%), os DIUs de cobre (n=2, 4,5%) e uma (2,3%) optou pela ligadura de trompas (Tabela 2).
 


Durante o estudo, cinco mulheres interromperam o uso do método escolhido por intenção de engravidar; destas, duas engravidaram durante o estudo, resultando em uma taxa de gravidez de 4,5% (IC95% = 0,6-15,5). Essas duas mulheres não relataram complicações maternas ou fetais.
A taxa de continuação do uso dos contraceptivos diminuiu em ambos os grupos durante o período de acompanhamento de 12 meses. Entre aquelas que usaram métodos apenas com progesterona, a taxa de continuação foi de 60,7% (IC95%=40,4-76,0), enquanto entre aquelas que usaram os outros métodos foi de 68,7% (IC95%=40,5-85,6) (Tabela 3), sem diferença estatística entre os grupos (p=0,641; Figura 2).
 

 



Discussão
Existem poucos estudos sobre escolha contraceptiva em mulheres com DF no Brasil e nossos resultados foram comparáveis aos resultados de um estudo realizado em São Paulo, Brasil e publicado em 2017, no qual >80% das mulheres com DF relataram usar contracepção, com predomínio do contraceptivo hormonal combinado.8 Em nosso estudo, antes do aconselhamento quase todas as mulheres relataram usar algum método contraceptivo e quase 50% delas relataram usar um método não confiável, como preservativos. Por outro lado, após o aconselhamento, a maioria delas escolheu métodos mais confiáveis. A alta preferência das mulheres do nosso estudo por métodos apenas com progesterona pode ter sido influenciada pelo próprio aconselhamento, que expôs os riscos e benefícios de cada método. As organizações de saúde.16,17 não contraindicam nenhum método para mulheres com DF, embora algumas condições de saúde além da DF possam limitar a escolha. Alguns estudos10,13,14,19 têm sugerido benefícios à saúde de mulheres com DF que utilizam métodos somente com progesterona, como a diminuição da frequência das crises de dor, embora mais estudos ainda sejam necessários para confirmar essa hipótese. No entanto, entre os métodos somente com progesterona, os dispositivos intrauterinos de levonorgestrel têm sido recomendados por serem considerados um método contraceptivo reversível de longa duração (LARC), não dependerem da memória da mulher e apresentarem menor risco de falha contraceptiva.17,20
O contraceptivo hormonal oral combinado, embora culturalmente aceitos pela maioria das mulheres no Brasil, como foi citado em um estudo realizado em São Paulo, entre mulheres com DF8, não foi a primeira escolha entre as mulheres com DF em nosso estudo. Isso pode ser uma consequência da hipotética associação do contraceptivo hormonal combinado com um risco aumentado de tromboembolismo venoso em mulheres com alguma condição clínica predisponente.15,21 Nenhuma sobreposição de riscos do uso de contraceptivos hormonais combinados com a fisiopatologia da DF foi documentada em estudos bem delineados.15,19,22
Considerando que mulheres com DF podem usar qualquer método contraceptivo quando adequadamente monitorado,7,17,23 e que a DF pode levar a desfechos gestacionais desfavoráveis tanto para a mãe quanto para a criança,5,6 observamos que as mulheres no presente estudo entenderam a necessidade de escolher métodos mais eficazes e trocaram métodos menos seguros por métodos mais seguros. Isso reforça a necessidade de melhorar o conhecimento sobre métodos contraceptivos das mulheres com DF para que elas possam fazer escolhas mais bem informadas.18,24 No início do estudo, antes do aconselhamento, quase metade das mulheres usava preservativos masculinos como único método. Os preservativos masculinos também foram os contraceptivos mais comuns usados por mulheres jamaicanas e americanas diagnosticadas com DF em estudos anteriores.25,26 A alta taxa do método de barreira pode ser devido ao medo ou dúvidas na prescrição de métodos contraceptivos hormonais para mulheres com condições crônicas como a DF.27
Após o aconselhamento, os métodos de progesterona isolada foram os mais escolhidos. A mudança dos métodos pode estar relacionada ao fato do aconselhamento contraceptivo ter sido personalizado. O aconselhamento centrado na paciente também deve motivar a equipe de saúde reprodutiva a oferecer o melhor método para atender às necessidades de cada paciente, ao mesmo tempo em que fornece orientação sobre seu uso correto e os possíveis efeitos adversos.10,26 Um estudo conduzido em Uganda e Paquistão em mulheres em idade fértil revelou que o aconselhamento de qualidade no planejamento familiar, medido pelas informações que as usuárias receberam dos provedores, está associado à subsequente continuação do uso do contraceptivos.23 Independentemente do método contraceptivo selecionado, estudos sobre o uso de contraceptivos tem demonstrado que mulheres com DF têm baixa adesão.13,18 A motivação e o momento da vida reprodutiva podem interferir na escolha e na continuação de diferentes métodos.25,27,28
Uma Pesquisa de Planejamento Familiar realizada com jovens adultos com DF de 18 a 30 anos, em um grande hospital acadêmico em Baltimore, Estados Unidos, sugere uma associação entre ter um obstetra/ginecologista e o uso do contraceptivo prescrito.11
Os cuidados de saúde reprodutiva geralmente exigem que o médico inicie a conversa, pois os pacientes podem não apresentar voluntariamente suas preocupações íntimas de saúde. De preferência, essa discussão deve começar desde o início da vida reprodutiva, com o pediatra, incluindo o clínico, o hematologista e o ginecologista.11,15 Além disso, a descontinuação do método pode estar relacionada ao medo de efeitos colaterais, à gravidade da doença, à falta de conhecimento sobre fertilidade e às crenças do provedor.9,10,18,19,24
O DIU de cobre16,17 foi selecionado por poucas mulheres, embora não haja evidências atuais para limitar o seu uso em mulheres com DF, exceto para mulheres com anemia devido ao aumento do fluxo menstrual, caso em que os riscos e benefícios do uso do DIU devem ser considerados.16,17 No entanto, ele foi relatado como uma opção segura para a maioria das mulheres em idade reprodutiva com condições crônicas. As pacientes também podem ter medo do DIU de cobre porque é um corpo estranho colocado no útero por um tempo prolongado,10 ou superestimar a chance de gravidez associada ao uso do DIU.18
O uso correto de métodos contraceptivos é uma estratégia importante para reduzir o risco de gravidez não planejada em mulheres com DF.14 Nesta coorte, a taxa de gravidez foi baixa, mesmo considerando o pequeno tamanho da amostra, e é importante destacar que aquelas que engravidaram durante o estudo pararam de usar anticoncepcionais porque queriam a gravidez.
Vale a pena examinar preocupações relacionadas ao planejamento da gravidez e práticas contraceptivas para mulheres com DF.10 Isso foi observado em um estudo anterior em nosso serviço que destacou a necessidade de mulheres com DF receberem mais atenção neste aconselhamento.29 Nesse sentido, também é possível encorajar mulheres com DF e outras condições médicas a aumentar o uso de LARCs.10,12,18 Não podemos desconsiderar a interferência das crenças do prescritor na escolha de métodos contraceptivos pelas mulheres; no entanto, isso é difícil de mensurar.29
Este estudo encontrou uma taxa de continuação de 60,7% para métodos somente de progesterona no primeiro ano de acompanhamento, sendo o injetável de medroxiprogesterona o mais utilizado entre estes. Isso foi semelhante aos achados de um estudo de coorte prospectivo que incluiu 5.087 mulheres dispostas a iniciar um novo método contraceptivo reversível nos Estados Unidos e registrou uma taxa de adesão de 57% ao acetato de medroxiprogesterona de depósito (DPMA) no primeiro ano de uso.20
As mulheres deste estudo foram acompanhadas por um ano e, embora não tenha havido diferença na taxa de continuação entre os grupos, os métodos somente com progesterona foram os mais escolhidos, corroborando a recomendação da literatura de que são os mais adequados para o grupo de mulheres com DF.7,19,12,30
Os resultados deste estudo são limitados devido ao pequeno tamanho da amostra e foi conduzido em uma única instituição, embora semelhante em tamanho a outros estudos entre mulheres com DF.11,26,27 Portanto, estudos multicêntricos são necessários, uma vez que a DF não é uma condição muito comum.
Concluímos que as taxas gerais de continuação desses métodos foram satisfatórias. Não foi observada diferença significativa na taxa de continuação ao comparar o grupo de métodos somente com progesterona ao grupo de outros métodos contraceptivos, embora as mulheres com DF tenham selecionado com mais frequência métodos somente com progesterona.
Esta pesquisa prospectiva destaca o impacto benéfico do aconselhamento contraceptivo em ajudar mulheres com DF a fazer uma escolha contraceptiva informada e eficaz.

Agradecimentos
Agradecemos à Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (FACEPE) pela bolsa de doutorado (Número do processo: IBPG-0860-4.01/16) concedida a Evelyne Nascimento Pedrosa; ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Brasil pela bolsa de produtividade (Número do processo: 304094/2017-0) concedida a Ariani Impieri Souza e o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) por meio do Programa de Excelência Acadêmica (PROEX).

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Contribuição dos autores
Pedrosa EN: desenho, coleta e análise de dados e escreveu o manuscrito. Corrêa MSM: supervisionou o estudo. Silva FAC: desenho e coleta de dados. Ferreira ALCG e Hazin-Costa MF: projetaram o estudo. Souza AI: projetou e supervisionou o estudo, realizou a análise de dados e escreveu o manuscrito. Todos os autores aprovaram a versão final do artigo e declaram não haver conflitos de interesse.

Recebido em 12 de Junho de 2023
Versão final apresentada em 3 de Agosto de 2024
Aprovado em 6 de Agosto de 2024

Editora Associada: Leila Katz

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