Publicação Contínua
Qualis Capes Quadriênio 2017-2020 - B1 em medicina I, II e III, saúde coletiva
Versão on-line ISSN: 1806-9804
Versão impressa ISSN: 1519-3829

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Deslocamento intermunicipal como barreira de acesso ao aborto previsto em lei. Brasil, 2010-2019

Marina Gasino Jacobs1; Alexandra Crispim Boing2

DOI: 10.1590/1806-9304202200040007

RESUMO

OBJETIVOS: analisar as restrições aos abortos previstos em lei (APL) realizados no Brasil entre 2010 e 2019 quanto à necessidade de deslocamento das usuárias, bem como quanto ao dispêndio de tempo e dinheiro nessas viagens.
MÉTODOS: estudo descritivo dos registros de atendimentos ambulatoriais e internações para APL entre 2010 e 2019. Foram identificados a oferta municipal e os fluxos intermunicipais para realização dos APL, a disponibilidade de transporte coletivo para esse deslocamento, bem como seu custo e tempo.
RESULTADOS: 2,6% dos municípios brasileiros tiveram oferta sustentada de APL entre 2010 e 2019. Dos 15.889 APL realizados, 14,8% se deram em municípios diferentes daqueles de residência da usuária. Quanto menor o porte populacional do município de residência, maior o percentual com necessidade de viajar. Desses deslocamentos intermunicipais, 16,0% tinham ligações regulares de ida e retorno em transporte público. O tempo de viagem total variou de 26 minutos a quatro dias e meio, e o custo de R$ 2,70 a R$ 1.218,06; as maiores medianas estiveram entre as residentes da região Centro-Oeste.
CONCLUSÕES: a concentração de serviços, a deficiência de transporte público intermunicipal, bem como o dispêndio com a viagem para acesso ao APL são barreiras às usuárias que precisam do serviço de saúde, demandando políticas públicas para sua superação.

Palavras-chave: Acesso aos serviços de saúde, Aborto legal, Equidade no acesso aos serviços de saúde, Serviços de saúde reprodutiva

ABSTRACT

OBJECTIVES: to analyze abortions provided by law (APL) carried out in Brazil between 2010 and 2019 regarding the need for travel of users, as well as the expenditure of time and money on these trips.
METHODS: descriptive study of records of outpatient care and hospitalizations for APL between 2010 and 2019. The municipal provision and the inter-municipal flows for the realization of the APL, the availability of public transportation for this travel, as well as its cost and time, were identified.
RESULTS: 2.6% of Brazilian municipalities had a sustained provision of APL between 2010 and 2019. Of the 15,889 APL performed, 14.8% occurred in municipalities other than those where the user lived. The smaller the population size of the municipality of residence, the higher the percentage of the need for travel. Of these inter-municipal trips, 16.0% had regular round-trip links by public transport. The total travel time ranged from 26 minutes to 4 and a half days, and the cost from R$2.70 to R$1,218.06; the highest medians were among residents of the Midwest region.
CONCLUSIONS: the concentration of services, the deficiency of inter-municipal public transport, and the expenditure on travel to access the APL are barriers to users that need the health service, demanding public policies to overcome them.

Keywords: Health services accessibility, Legal abortion. Equity in access to health services, Reproductive health services

Introdução

É estimado que tenham ocorrido anualmente 55,7 milhões de abortos no mundo entre 2010 e 2014, sendo mais de 6,4 milhões apenas na América Latina. Duas de suas sub-regiões, a América do Sul e o Caribe, tiveram as maiores taxas de incidência de aborto no mundo,1 ainda que prática seja ilegal na maioria desses países.2 Há diversidade nas legislações nessas sub-regiões, variando desde países em que o aborto é legal e sem condicionantes no primeiro trimestre, como em Cuba, no Uruguai e na Argentina, e outros em que é totalmente proibido, como na República Dominicana e Suriname. Entretanto, na maioria dos países das sub-regiões o aborto é permitido apenas em situações excepcionais. Nesta última categoria se enquadra o Brasil, o maior e mais populoso país do grupo.2 No Brasil, desde o Código Penal de 1940,o aborto não é punível em gestações decorrentes de estupro ou para salvar a vida da gestante, e,desde decisão do Supremo Tribunal Federal em 2012,em casos de fetos anencéfalos.3 Nessas situações o serviço é ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) do país.

O acesso aos serviços de saúde depende de sua disponibilidade. No que tange ao aborto, a pouca disponibilidade pode levar a atraso do procedimento ou mesmo impossibilitá-lo devido aos limites legais de tempo gestacional.4 A localização dos serviços também é fundamental, pois quanto maior a distância entre a moradia e o estabelecimento menor é o acesso ao serviço.4–6 Todavia, as barreiras estão além da distância em si, pois envolvem as possibilidades de transporte, o tempo necessário e os custos.4 Dessa forma, como a distância não compreende a diversidade do território, o tempo de viagem é utilizado como indicador de acessibilidade. A maior demanda de tempo implica em necessidade de arranjos logísticos que comprometem o sigilo e acarretam maior custo.4

Os custos para a realização do aborto incluem o valor do procedimento em si, o transporte, a alimentação e o pernoite da usuária e acompanhante, custos de cuidados com dependentes e perda de ganhos por dias não trabalhados, os quais aumentam de acordo com o tempo de deslocamento.4 No caso brasileiro, não há desembolso pelo usuário no momento de realização do procedimento pelo SUS. Ademais, deslocamento, alimentação e pernoite devem também ser viabilizados pelo Estado quando o procedimento precisa ser realizado em outro município que não componha a mesma Região Metropolitana e esteja a mais de 50 km de distância do município de residência do usuário.7

Sabe-se que no país há poucos estabelecimentos com oferta efetiva de aborto previsto em lei: entre 2013 e 2015 eram 37 estabelecimentos, majoritariamente em capitais de estado.8 A pouca disponibilidade do serviço no território pode indicar a necessidade de viagens para o acesso ao aborto previsto em lei, entretanto não há informação sobre esse deslocamento, tampouco acerca do dispêndio financeiro e de tempo nesses trajetos para as pessoas que acessam o procedimento.

O dispêndio com as interrupções realizadas aponta para uma possível barreira de acesso ao aborto previsto em lei no país, barreira essa que pode ser instransponível a alguns grupos. A impossibilidade de acesso ao aborto legal leva a piores desfechos de saúde mental da pessoa gestante,9 assim como a outras complicações de saúde, inclusive decorrentes de interrupções inseguras da gestação.10 Dessa forma, a viabilização do APL compõe o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva, assim como contribui para a redução da mortalidade materna, atravessando ao menos duas das metas brasileiras para o alcance de Boa Saúde e Bem-Estar, terceiro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.11 Diante desse contexto e considerando que as implicações do deslocamento podem impedir o acesso das pessoas a serviços de saúde, o presente estudo busca desenhar o panorama dos procedimentos realizados entre 2010 e 2019, traçando a necessidade de deslocamento e a estimativa de dispêndio de tempo e dinheiro com transporte para a realização do APL no Brasil.


Métodos

Trata-se de um estudo de corte transversal descritivo dos deslocamentos para realização de APL. Foram incluídos os registros de atendimento ambulatorial e internações entre janeiro de 2010 e dezembro de 2019 no Brasil com diagnóstico principal: CID O04 “Aborto por razões médicas e legais” de pessoas em idade fértil (de 10 a 49 anos) com procedimentos de “Curetagem pós-abortamento” ou “Esvaziamento uterino pós-aborto por Aspiração Manual Intrauterina (AMIU)” registrados no Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) ou no Sistema de Informações Hospitalares (SIH). A inclusão apenas desses procedimentos deveu-se à sua compatibilidade com o CID de acordo com a Tabela de Procedimentos, Medicamentos e Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS. Os bancos de dados são de acesso público e disponibilizados para transferência pelo Departamento de Informática do SUS (DATASUS) do Ministério da Saúde.

Foram utilizadas as variáveis que indicam o município de residência e o município de realização dos abortos previstos em lei. Os municípios foram localizados na malha digital do Brasil com divisão político-administrativa vigente no Censo de 2010 disponibilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os pontos de localização dos municípios são referentes ao distrito sede, conforme o cadastro de localidades do IBGE também de 2010.

Os municípios onde foram realizados os APL foram categorizados quanto à estabilidade da oferta como: oferta pontual, oferta esporádica e oferta sustentada. Municípios com oferta pontual são aqueles que realizaram um procedimento durante todo o período, os de oferta esporádica são os que realizaram menos de um procedimento ao ano como média do período (dois a nove no período), e os de oferta sustentada aqueles que realizaram ao menos um procedimento ao ano como média do período (dez ou mais no período).

Para os procedimentos que não foram realizados nos municípios de residência das usuárias, foram desenhados os fluxos de deslocamento. Cada linha representa o deslocamento de ao menos uma usuária. Para a representação dos fluxos foi utilizado o plugin Fluxo do software Terraview 4.2.2. O mapa final foi elaborado no software Qgis 3.10.7. Foi adotado o Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas (SIRGAS) 2000.

Após a identificação dos fluxos intermunicipais para a realização dos abortos previstos em lei, foram identificados os trajetos com disponibilidade de ligação via transporte coletivo, seu custo e tempo de deslocamento. Para isso, foi utilizada como fonte de informação a pesquisa “Ligações Rodoviárias e Hidroviárias” de 201612 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Na pesquisa do IBGE “Ligações Rodoviárias e Hidroviárias” são apresentadas todas as ligações rodoviárias e hidroviárias intermunicipais em transporte público coletivo, sejam formais ou informais, existentes no Brasil em 2016. Na pesquisa, não é considerado transporte intermunicipal aquele que acontece em um mesmo arranjo populacional, que são grupos de municípios que têm forte integração populacional. A pesquisa detalha tempo e custo de deslocamento das ligações existentes. Inclui todos municípios brasileiros e as ligações com as seguintes características: abertas ao público em geral mediante o pagamento de tarifa; entre sedes de municípios; com local de saída, chegada e trajeto pré-fixados; e com as partidas de veículos em dias e horários determinados.12

As ligações referentes aos deslocamentos intermunicipais fora de arranjos populacionais foram buscadas na referida pesquisa.12 Foi descrita, assim, a existência ou não da ligação em transporte público de ida e de retorno entre local de moradia e de realização de APL, assim como o tempo e o custo do deslocamento quando a ligação existia. Os valores de ida e volta foram somados, encontrando o custo e tempo totais de viagem. Quando foi encontrada apenas uma das ligações, de ida ou de retorno, o tempo e custo totais foram estimados considerando que a ida e a volta demandariam o mesmo tempo e recurso, ou seja, foram estimados pela duplicação dos valores da ligação encontrada. Quanto aos valores, em 2016 o salário-mínimo mensal no país era de R$880,00 ou US$412,56 quando corrigidos pela paridade do poder de compra com base no PIB,13 mesma correção utilizada no restante do manuscrito.

Finalmente, foram descritos o tempo e o custo de deslocamento por porte populacional de acordo com o Censo populacional de 201014sob as categorias: até 5.000 habitantes, de 5.001 a 10.000, de 10.001 a 20.000, de 20.001 a 50.000, de 50.001 a 100.000, de 100.001 a 500.000, e mais de 500000 habitantes; e região de residência da usuária: norte, nordeste, sudeste, sul, centro-oeste.


Resultados

Foram realizados 15.889 procedimentos no Brasil, em 627 municípios. Dos municípios que registraram a oferta do procedimento, 251 (40%) apresentaram oferta pontual, com apenas um procedimento durante toda a década, 233 (37,2%) tiveram oferta esporádica, com menos de um procedimento ao ano, e 143 (22,8%) oferta sustentada, realizando ao menos um procedimento ao ano na média do período. Este último grupo, correspondente a 2,6% dos 5.565 municípios brasileiros, concentrou 92,8% dos APL que se deram no país naquela década. Todas as unidades da federação e regiões tiveram ao menos um procedimento registrado, variando de um no Amapá, no Norte do país, a 3.646 em São Paulo, no Sudeste (Figura 1).
 


Ainda que as internações ou atendimentos tenham acontecido em 627 (11,3%) dos municípios brasileiros, as usuárias que passaram pelo procedimento de APL residiam em 3.104 (55,7%) diferentes municípios. Do total de procedimentos, 11.721 (73,8%) foram realizados no município de residência da usuária e outros 1.808 (11,4%) em municípios distintos, mas no mesmo arranjo populacional, totalizando 13.529 procedimentos (Tabela 1). Outros 2.218 (14,0%) procedimentos aconteceram fora do município ou arranjo populacional de residência da usuária, mas na mesma unidade da federação, e 141 (0,9%) procedimentos aconteceram em uma unidade da federação distinta daquela de residência da usuária; um dos registros não tinha município de residência conhecido. Os fluxos de deslocamento são apresentados na Figura 1.
 


De todos os 2.359 deslocamentos intermunicipais, 92,8% tinham transporte público disponível em ao menos um dos trechos do trajeto (Tabela 2). Todavia, ida e retorno em transporte aberto ao público em geral, entre sedes de municípios e com regularidade espacial e temporal estavam presentes em apenas 16,0% dos deslocamentos. O tempo de viagem total variou de 26 minutos a quatro dias e meio (6.444 minutos). O custo da viagem também tem grande amplitude, de R$ 2,70 (US$1,27) a R$ 1 218,06 (US$571,05).
 


O percentual das pessoas que precisaram de deslocamento intermunicipal para realização de APL foi maior entre residentes dos municípios de menores portes (Tabela 1), onde a disponibilidade de transporte público intermunicipal para esse deslocamento foi menor (Tabela 2). Já o tempo e custo dos deslocamentos para acessar o procedimento foram maiores para as residentes em municípios de maiores portes (Tabela 2). Os deslocamentos realizados pelas residentes dos municípios de até 50.000 habitantes tiveram como principal destino (22,0%) Teresina, capital no Nordeste do país. Já entre as residentes de municípios com mais de 50.000 habitantes, o principal destino (37,1%) foi o município de São Paulo, capital no Sudeste. Dos deslocamentos intermunicipais das residentes de municípios entre 100.001 e 500.000 habitantes, 40,4% tiveram São Paulo como destino, e entre as residentes de municípios com mais de 500.000 mil habitantes, 74,7% tiveram esse mesmo destino.

A região com menor necessidade de deslocamento foi a Sudeste (Tabela 1), onde houve também maior número de municípios com oferta de APL: 239. Os menores custos de deslocamento estiveram na região Nordeste (Tabela 2), onde 126 municípios fizeram APL. Os menores tempos de deslocamento estiveram na região Sul (Tabela 2), onde 145 municípios ofertaram o procedimento. As Regiões Norte e Centro-Oeste tinham, respectivamente, 71 e 43 municípios com oferta, e apresentaram os maiores dispêndios com deslocamento. Na região Centro-Oeste, a mediana foi demais de sete horas de ida e volta até o estabelecimento de saúde com oferta do APL, com custo mediano de R$ 93,90 (US$44,00) (Tabela 2). A região Centro-Oeste foi também aquela com menor disponibilidade de transporte público para os deslocamentos (Tabela 2) e a que teve maior percentual de deslocamentos a um mesmo município (47,1%), seguida da Nordeste (46,8%), Norte (37,6%), Sudeste (27,8%) e Sul (18,2%).


Discussão

Entre 2010 e 2019 aconteceram por ano em média 1.589 APL no Brasil, país com quase 200 milhões de habitantes já em 2010.14 A título de perspectiva, considerando apenas uma das situações em que o aborto é permitido no Brasil, foram estimadas ao menos 18.734 gravidezes em decorrência de estupro no país em 2019.15 Ou seja, menos de uma em cada 11 gestantes que poderiam recorrer ao aborto previsto em lei o acessou.

Os abortos previstos em lei aconteceram majoritariamente (92,8%) nos municípios com oferta sustentada do procedimento, grupo de 143 municípios que representam 2,6% do total dos municípios brasileiros, outros 484 municípios tiveram oferta pontual ou esporádica. A realização de algum aborto previsto em lei no período, contudo, não garante a oferta permanente do procedimento, tampouco a oferta para as três causas permitidas no país ou a qualquer tempo gestacional, já que os serviços com oferta do procedimento estabelecem limites próprios de tempo gestacional e de causas atendidas. Dessa forma, a disponibilidade do serviço varia a depender da causa e diminui com o aumento da idade gestacional.8,15 Além de potencial atraso do procedimento, a baixa disponibilidade do serviço e a consequente necessidade de deslocamento pode impedir a realização do aborto devido ao tempo gestacional, especialmente nas gestações decorrentes de estupro. Ainda que no Código Penal brasileiro não seja estabelecida uma idade gestacional limite para a não punibilidade de aborto nessas situações, o Ministério da Saúde apresenta em norma técnica o limite de 20 ou 22 semanas.16 Dado que essa norma é a utilizada como referência para os serviços do SUS, são poucos os estabelecimentos que realizam o aborto em gestações decorrentes de estupro com mais de 22 semanas no país.15

Ainda que a realização dos procedimentos tenha sido concentrada em um pequeno grupo de municípios, a maioria dos APL, 85,2%, se deu em residentes do mesmo arranjo populacional, e 73,8% em residentes do mesmo município. Em 2016, quando analisadas todas as internações do país, independentemente do motivo da internação, 67,3% haviam ocorrido nos municípios de residência dos usuários.17 Nesse sentido, o alto percentual de realização de aborto previsto em lei no município de residência da usuária acompanha o encontrado nas internações como um todo, resultado da concentração populacional e de recursos hospitalares nas grandes cidades.18 Entretanto, o pequeno percentual de deslocamentos, ainda menor nos casos de APL, pode apontar o não acesso aos serviços quando esses não estão disponíveis no município de residência de quem deles precisa.19 Essa hipótese é corroborada pelo achado de que 74,7% dos APL foram realizados em residentes de municípios com mais de 100 mil habitantes, ainda que esse grupo de municípios concentrasse apenas 54,7% da população brasileira,14 podendo indicar iniquidade de acesso ao serviço.

A necessidade de deslocamento constitui-se uma barreira de acesso à atenção hospitalar, em 2000, mesmo distâncias de até 20km já diminuíam a acessibilidade no Brasil,19 o deslocamento demanda disponibilidade de transporte, tempo e recursos financeiros,4 nem sempre disponíveis. Especificamente quanto ao aborto, diferentes países apontam que o aumento da distância até o estabelecimento com oferta do serviço diminui o acesso ao procedimento seguro,4–6 sendo um fator que leva à busca por outras formas, potencialmente perigosas, de interromper a gestação.20 A distância é uma barreira mais presente entre as jovens, residentes de áreas rurais, pobres, não-brancas, e de mais de 12 semanas de gestação.4 São também as socialmente vulnerabilizadas aquelas com menos condições de superar a barreira geográfica, destacadamente as não-brancas e de baixa escolaridade.5,21 A indisponibilidade de transporte é em si uma possível barreira de acesso a serviços de saúde. No caso brasileiro, 16,0% dos deslocamentos intermunicipais diretos para APL tinham ida e volta disponíveis em transporte público rodoviário ou hidroviário, 76,8% dos deslocamentos tinham transporte público disponível em um dos trechos no trajeto, e outros 7,2% não tinham qualquer um dos trechos. A ausência de ligação direta em transporte público rodoviário ou hidroviário torna necessário estabelecimento de alternativas de acesso. Nesse caso, seria imperativo o uso de mais de uma linha de transporte público, ou o uso transporte particular ou aéreo, o que pode encarecer e inviabilizar o acesso dos mais pobres, evidenciando a necessidade de transporte sanitário providenciado pelo Estado.

Entre os municípios de pequeno porte, a grande maioria das pessoas precisou viajar para acessar o APL. Já a necessidade de deslocamento entre as residentes de municípios de maiores portes foi pequena, todavia, quando o deslocamento se fez necessário, demandou mais tempo e dinheiro. Esse perfis refletem a exclusividade de oferta de aborto em serviços de mais densidade tecnológica,22 concentrando-a em maiores centros urbanos.8 A necessidade de deslocamento entre as residentes dos municípios de maior porte, aqueles que concentram a oferta de aborto, pode dever-se à busca por atenção especializada, pois no período analisado, esses deslocamentos direcionaram-se a São Paulo, maior polo de oferta de serviços de alta densidade tecnológica no país.23

O tempo de deslocamento na região Centro-Oeste foi o maior entre as regiões, apontando a pouca capilaridade do serviço de APL. A concentração desses serviços acompanha a dos outros procedimentos que demandam internação hospitalar na região, os quais estão majoritariamente nas capitais dos estados, sem polos secundários de assistência à saúde, o que, ainda que com menor intensidade, repete-se na região Norte do país.23 Os deslocamentos intermunicipais mais rápidos foram de 20 minutos, enquanto outros levaram dias. O aumento do tempo de deslocamento acarreta maiores implicações logísticas, com necessidade de arranjos frente às tarefas diárias, que comumente incluem o cuidado com dependentes, trabalho e escola, gerando maior dificuldade em manter sigilo acerca do procedimento e potencial perda financeira, a depender do vínculo de trabalho.4

Além desses gastos, os custos diretos são uma carga às gestantes que precisam viajar para acessar o aborto, o que inclui transporte, acomodação e refeições para si e muitas vezes para acompanhante.4 No Brasil, o SUS pode arcar com esses custos,7 contudo, os valores pagos são R$3,70 (US$1,73) para cada 27 milhas náuticas em transporte fluvial, R$4,95 (US$2,32) para cada 50 km em transporte terrestre ou são de R$181,50 (US$85,09) para cada 200 milhas em transporte aéreo; assim como diária de R$8,40 (US$3,94) para alimentação ou R$24,75 (US$11,60) para alimentação e pernoite.24 Esses recursos estão sujeitos ao teto financeiro da alta e média complexidade, e, quando pagos na forma de reembolso à usuária, não cobrem os gastos.25 Dessa forma, os custos diretos podem continuar se configurando uma barreira de acesso ao serviço.

Quanto aos valores dispendidos exclusivamente com deslocamento, houve variação de 0,3% a 138,4% de salário-mínimo mensal, ou seja, pode ter chegado a ser dispendido em transporte de uma pessoa o valor referente a seis semanas de trabalho (264 horas) em valores de 2016 no Brasil. Sendo assim, ainda que a assistência à saúde seja gratuita no país, o dispêndio financeiro com o deslocamento pode ser proibitivo ao acesso quando o transporte não é garantido também pelo Estado.

Além dos custos já mencionados, podem ainda ser considerados os prejuízos decorrentes da não obtenção do acesso. Pessoas que não conseguem o aborto previsto em lei apresentam mais chances agravos à saúde mental, com sintomas de ansiedade, baixa autoestima e insatisfação com a própria vida a curto prazo,9 assim como maior probabilidade de apresentar eventos de saúde potencialmente fatais,10 bem como o risco de interromper a gestação de forma insegura, o que pode levar à morte.10,20

A política brasileira opta pela oferta de aborto previsto em lei apenas em hospitais gerais, maternidades, prontos-socorros, Unidades de Pronto-Atendimento e serviços de urgência,22 contudo, o procedimento poderia ser ofertado com segurança na atenção primária até ao menos a 12ª semana de gestação26,27 e via telessaúde até a 10ª semana.15,28 A capilarização da oferta por meio da atenção primária e da telessaúde diminuiria a necessidade de deslocamento, ampliando o acesso ao serviço e reservando os deslocamentos e os leitos apenas a situações em que haja de fato necessidade de cuidados hospitalares para a interrupção da gestação.

Dentre as limitações do presente estudo está o uso de bases de dados de sistemas informação que têm como finalidade o financiamento dos serviços pelo SUS, o que não inclui os procedimentos realizados em serviços privados com pagamento direto ou por planos de saúde. Ademais, como há teto de recursos relativos à média e alta complexidade a serem pagos a estados e municípios, há risco de subnotificação de produção que exceda esse teto. Da mesma forma, pode haver subnotificação de produção que divirja de pactuações quantitativas de procedimentos e fluxos nas Regiões de Saúde. Ainda assim, as bases de dados utilizadas são nacionais com registro dos atendimentos ambulatoriais e internações financiadas pelo SUS, sejam na rede pública ou privada.29,30 Ainda quanto aos sistemas de informação, a diversidade de contextos em que esses são alimentados pode fragilizar a uniformidade e qualidade, visando minimizar esses problemas, todos os estabelecimentos seguem uma mesma normativa nacional e ambos os sistemas têm mecanismos automáticos de validação, com bloqueio de inconsistências.29,30 A inclusão apenas dos registros com diagnóstico principal “Aborto por razões médicas e legais”e daqueles procedimentos compatíveis é adequada às normativas dos sistemas utilizados, mas pode ter excluído registros verdadeiros, principalmente de casos de risco à vida da gestante e anencefalia fetal. Além disso, abortos exclusivamente medicamentosos também não estão entre os registros, já que não constam como procedimentos na Tabela de Procedimentos, Medicamentos e Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS. Essas são debilidades dos registros utilizados e podem ter subestimado o número de procedimentos realizados no país.

No que diz respeito às informações de tempo e custo de viagem, os dados utilizados se referem ao ano de 2016 e é possível que as ligações encontradas não tenham sido perenes de 2010 a 2019. Ainda assim, ouso dos dados da pesquisa “Ligações Rodoviárias e Hidroviárias” de 2016 do IBGE justifica-se, pois, as informações de distância em linha reta ou em automóvel não compreendem a complexidade e diversidade dos contextos brasileiros, com diferentes relevos, qualidades de estrada ou hidrovias e modalidades de transporte disponíveis.

O presente estudo encontrou concentração da oferta do APL em alguns municípios do país, pouca disponibilidade de transporte público de ida e retorno entre os municípios de residência e de realização do procedimento, bem como custos e tempos de deslocamentos que chegaram a valores proibitivos considerando a realidade social do país. O aborto nas situações previstas em lei é um serviço de saúde e deve ser de acesso universal, mas a demanda de tempo e dinheiro para o deslocamento pode dificultar ou impedir que parte das que necessitam acessem o serviço. Entende-se, dessa forma, que a restrição da oferta do aborto legal a estabelecimentos de maior complexidade e sua concentração em grandes centros urbanos compromete a preservação da dignidade, da vida e da saúde de meninas, mulheres e outras pessoas potenciais gestantes no Brasil.

Agradecimentos

Agradecemos a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) pelo apoio financeiro (Código de Financiamento 001).


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Recebido em 27 de Agosto de 2021
Versão final apresentada em 28 de Fevereiro de 2022
Aprovado em 7 de Junho de 2022

Contribuição dos autores: Jacobs MG e Boing AC conceberam o artigo. Jacobs MG redigiu a primeira versão do manuscrito. Ambas as autoras trabalharam sobre versões seguintes, aprovaram a versão final do artigo e declaram não haver conflito de interesse.

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